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Ela conta que não tem nenhuma comorbidade, por isso subestimou o vírus e pensou que, caso fosse infectada, ficaria em isolamento por 14 dias, com sintomas leves, e depois tudo voltaria ao normal. Mas não foi isso que aconteceu...

Paula Juliana Rodrigues da Silva, 36, não imaginava que seria internada com quase 90% do pulmão comprometido, sem conseguir respirar direito ou ficar em pé sozinha. Moradora de Pindamonhangaba, no interior de São Paulo, ela conta que não tem nenhuma comorbidade, por isso subestimou o vírus e pensou que, caso fosse infectada, ficaria em isolamento por 14 dias, com sintomas leves, e depois tudo voltaria ao normal. Mas não foi isso que aconteceu. Ao todo, foram 12 dias no hospital, sendo oito na UTI. 

Paula diz que se cuidava, usava máscara quando saía de casa e dentro da faculdade em que trabalha. Porém, na sala da secretaria onde ficava com outras 10 pessoas, ela se sentia segura, relaxava e não usava máscara. Por isso acredita que tenha sido contaminada no setor, pois em janeiro uma colega de trabalho foi infectada pelo coronavírus.

"Daí eu não sei se liga uma chave na nossa cabeça, mas comecei a sentir uma dorzinha no corpo, como se fosse o início de uma gripe. Mas pensei que era neurose", conta a assistente administrativa, que foi ao pronto-socorro e foi afastada do trabalho por dez dias. Mas no último dia de isolamento, os sintomas começaram a piorar, e ela acabou sendo internada. 

"Entre eu ir para o PS e voltar para fazer o teste, comecei a ter muita, muita tosse. Então, fui para o pronto-atendimento para fazer o PCR, fiquei no soro com dramin e dipirona e a médica prescreveu um xarope para a tosse seca e fui embora. E fui piorando, piorando", recorda. 

Paula tem uma prima médica, que chegou a receitar um expectorante. "Só que nisso eu já tinha perdido o olfato, o apetite e não conseguia comer de jeito nenhum. Não conseguia mais ficar em pé e nem falar direito, e esse tempo todo achando que estava fraca", relembra. Ela conta que ainda mandou mensagem para uma tia em um domingo pedindo ajuda, já que mora sozinha. 

"Por sorte, o meu irmão estava com o carro da empresa e eles vieram me buscar, e no que eu fui descer a escada, percebi que estava com dificuldade de respirar", diz.

"Falei para o médico que não queria morrer" 

Ao chegar ao hospital particular, Paula levou um susto, pois foi direto para uma UTI adaptada para covid-19, já que a UTI convencional estava lotada. "A hora que estava indo para o quarto ouvi que, na verdade, estava indo para uma UTI —ali caiu a ficha. Se tivesse esperado mais um dia para procurar ajuda, não teria sobrevivido", desabafa aliviada. 

O caso de Paula era grave, mas como ela é jovem e sem comorbidades, os médicos decidiram, inicialmente, não intubá-la. "Como eu não intubei, fiquei no cateter de alto fluxo, que é um ar muito forte, tanto que nos primeiros cinco dias eu não conseguia comer, porque o ar entra pelo nariz e parece que sai pela boca, então parecia que estava babando. Todo dia coletando sangue, muita medicação, soltou meu intestino".

"Tinha que fazer um procedimento chamado ventilação não mecânica —é como se você tivesse num veículo muito rápido, colocasse a cara para fora e viesse o vento. Eu começava a ter crise de pânico, não conseguia usar, e tive que ser medicada com ansiolítico, porque ficava muito ansiosa. Hoje, toda vez que vejo alguém reclamando da máscara que a gente tem que usar na rua, comento: 'nossa, é que você não viu a máscara de ventilação não invasiva'", alerta Paula, ressaltando que depois que foi para a UTI normal, embora estivesse melhorando, a experiência foi ainda pior.

"Meu maior medo era alguém morrer na minha frente" 

"Do meu lado as divisórias eram todas em box de vidro, e eu evitava olhar porque não sabia se tinha gente intubada ou pior do que eu. É angustiante. Dormia bastante, mas fiquei o tempo todo consciente", relata, acrescentando que acordava a noite várias vezes com o barulho do cateter e da máquina que apitava quando a saturação subia. No dia 8 de fevereiro, ela saiu da UTI e foi para o quarto, ainda usando o cateter de alto fluxo. "Tirei no dia 9, e foi a primeira vez, depois de 9 dias, que tomei aquele banho, não estava mais grudada em eletrodo ou presa naquele negócio de pressão". 

Três dias depois ela teve alta e pôde ir para a casa, mas foi só nesse momento que ela realmente se deu conta do risco que correu. "Quando saí e já estava no carro vindo para casa, meu tio disse que cheguei no hospital com 90% do pulmão comprometido: 'você chegou quase morta, a gente já estava tentando saber o que ia fazer com os seus gatos'. Isso foi o mais impactante dessa experiência toda". A princípio, Paula pensou que sua experiência serviria para alertar ao menos os mais próximos, mas revela que estava enganada. "Até o pessoal que trabalha comigo, que viu tudo que passei, não entende. O meu próprio irmão, que viu o estado que entrei no pronto-socorro, foi para uma festa de aniversário uns dias atrás", lamenta.

As sequelas permanecem

"Faz pouco mais de três semanas que tive alta, mas ainda sinto muita dor por conta dos acessos e todo dia tirando sangue e levando injeções na barriga. Ainda não consigo andar rápido, mas estou me recuperando. Já comecei a fazer fisioterapia cardiorrespiratória, vou passar no cardiologista e no neurologista porque as minhas mãos tremem muito. Também vou ao psicólogo, porque tem horas que começo a chorar, porque acho que se pegar de novo vou morrer. Na minha cabeça não existem mais sintomas leves, quem pegar vai morrer", finaliza a mulher.

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